“Por um mundo digital inclusivo: inovação e tecnologia para a igualdade de gênero” é o tema deste ano definido pela ONU para a celebração do Dia Internacional da Mulher, em 8 de março. Tema que também serve para orientar a Comissão da ONU sobre a Situação das Mulheres (CSW, na sigla em inglês) a empreender uma série de iniciativas e ações, em todo o mundo, na tentativa de mitigar a lacuna de gênero no ambiente digital, destacar a importância de se fortalecer os direitos de mulheres e meninas em espaços online e abordar a violência virtual baseada em gênero, algo potencializada por avanços de tecnologias da informação e de comunicação na última década.
A exclusão digital de mulheres tem raízes históricas e culturais profundas. Durante séculos, mente, razão e objetividade foram categorizadas como características masculinas, e coração, sentimento e subjetividade como femininas, universalizando homens como sinônimo de ciência e razão e mulheres como seu antônimo. No mundo ocidental, a inferiorização intelectual baseada em fundamentos sexistas criou a crença de que a mulher deveria se dedicar exclusivamente ao papel de esposa e mãe, limitando as oportunidades e a educação necessária para que ingressassem no mercado de trabalho. Se não bastassem os obstáculos culturais, barreiras institucionais as impediam de participar de programas de graduação e pesquisa científica, bem como obter financiamento para seus projetos.
À medida que elas passaram a reivindicar mais enfaticamente seus espaços, o estigma de fragilidade associado ao sexo feminino perdeu força. Apesar disso, séculos de preconceito geraram reflexos negativos que perduram até os dias de hoje, principalmente quando se observa a marginalização feminina em carreiras relacionadas à tecnologia, ciência da computação, engenharia e matemática. A falta de representação em ciências e tecnologia reforça estereótipos de gênero e perpetua a ideia de que os temas são campos estritamente masculinos.
Segundo o relatório UN Women’s Gender Snapshot 2022, da ONU Mulheres, globalmente, as mulheres ocupam apenas 2 em cada 10 empregos em ciência, engenharia e tecnologia da informação. Nas 20 maiores empresas globais de tecnologia, as mulheres representam apenas 33% da força de trabalho, ocupando apenas uma em cada quatro posições de liderança nestas empresas.
Embora a internet represente um leque de oportunidades e informações potencializadoras para sociedade, se usada de forma errada, expõe com muito mais frequência mulheres e meninas a assédios e abusos online. Segundo a ONU, em um estudo realizado com 51 países, foi revelado que 38% das mulheres já sofreram algum tipo de violência online; apenas 1 em cada 4 relatou casos às autoridades; e quase 9 em cada 10 optaram por limitar sua atividade online, aumentando ainda mais a lacuna digital de gênero.
A inclusão digital de mulheres é fundamental para garantir a equidade de gênero e promover um modelo de desenvolvimento socioeconômico inclusivo e sustentável. Infelizmente, ainda existem abismos e obstáculos para o pleno acesso e uso das tecnologias digitais pelas mulheres, especialmente pelas mais pobres. Por isso, é essencial que as políticas e estratégias sobre o tema tenham foco na educação, na ampliação de acesso a equipamentos e internet e no combate à violência virtual, estimulando a ascensão profissional e a representatividade feminina em posições de liderança na área.
O Dia Internacional da Mulher traz oportunidades para reflexões que vão além de celebrar as conquistas alcançadas pelas mulheres ao longo da história. É preciso reconhecer as desigualdades que ainda são escancaradas em muitas esferas da sociedade para que a necessidade de seguir avançando se mantenha viva. Afinal de contas, reivindicar tratamento igualitário para mulheres e meninas em relação aos seus direitos e condições de vida deve ser encarado por todos como um dever social e ético.
Pedro Werneck é analista da CNseg